*Paulo Sergio João
O modelo jurídico do trabalho temporário trazido pela Lei nº 6.019/74 é considerado atípico, de caráter eventual e precário comparativamente à condição de empregado contratado pelo regime da CLT. Por extensão, dado que não há vínculo de emprego e observado que não poderia ficar à margem da proteção trabalhista, a Lei em referência, no artigo 12, assegurou direitos assemelhados à relação de emprego, sem contudo, transformar o fundamento jurídico que dá origem à relação de trabalho temporário: a natureza própria do trabalho a ser executado.
Também não se trata de terceirização a relação jurídica que a lei estabelece porque a empresa fornecedora de mão de obra não é especializada na prestação de serviços nem tem gestão direta sobre os trabalhadores encaminhados para a execução de serviços temporários.
Desta feita, o aspecto mais importante na relação contratual é o que dispõe o artigo 2º da Lei: acréscimo extraordinário de serviços ou substituição de pessoal permanente. Vale dizer que não há trabalho de natureza temporária fora destas hipóteses.
De outro lado, para a execução de trabalho temporário não há prazo definido em contrato ou não poderia haver porque o tempo do trabalho não poderia ser previsto de forma antecipada, exceto no caso de substituição de pessoal permanente, devidamente circunstanciado o fato (afastamento por motivo de férias, licença gestante). O prazo de 03 meses que a lei traz como limitação (art. 10) não é do contrato, mas do tempo em que o trabalho deve ser realizado “vis à vis” o mesmo trabalhador. Ou seja, se for utilizada a mesma mão de obra para a execução do trabalho temporário que exceda o período de 03 meses, certo é dar tratamento de empregado, evitando-se o mal uso da lei.
O que se vê, na prática, são contratos em total desconformidade com o próprio conteúdo jurídico estabelecido pela Lei, fixando, em geral, os prazos na execução de trabalho temporário.
As decisões judiciais, por seu turno, não se pautam no conteúdo jurídico da Lei e o trabalho de natureza temporária passa a figurar como lugar comum dos contratos de emprego. A partir desta constatação observamos que de modo frequente o contrato recebe tratamento de contrato de prazo determinado.
O sítio do TRT da 2ª Região exibiu decisão da 13ª Turma (Processo 0002211-74.2014.5.02.0442 – Acórdão 20160209344), acórdão que teve como Relator o Desembargador Paulo José Ribeiro Mota, no sentido de considerar estável, por acidente do trabalho, o trabalhador inserido na relação de trabalho temporário por aplicação do teor da Súmula 378, item III, do Tribunal Superior do Trabalho, que se refere a que “O empregado submetido a contrato de trabalho por tempo determinado goza de garantia provisória de emprego, decorrente de acidente de trabalho, prevista no art. 118 da Lei nº 8.213/91”.
Observe-se que os julgados precedentes do item III da Súmula referem-se à garantia de emprego no contrato de prazo determinado e, por assim dizer, não abrange o trabalho temporário. A título de ilustração a seguinte ementa em caso de precedente da Súmula, citado em voto da lavra do Ministro Carlos Alberto Reis de Paula (RR 71000-56.2008.5.04.0030, 8ª T, DEJT 16.09.2011/J-31.08.2011):
“RECURSO DE REVISTA. CONTRATO DE EXPERIÊNCIA. ESTABILIDADE PROVISÓRIA. ACIDENTE DO TRABALHO. GARANTIA ORIUNDA DIRETAMENTE DA CONSTITUIÇÃO (ART. 7º, XXII, CF), AFASTANDO A RESTRIÇÃO INFRACONSTITUCIONAL (ART. 472, § 2º, DA CLT). Nas situações de afastamento por acidente de trabalho ou doença profissional, a causa do afastamento integra a essência sociojurídica de tal situação trabalhista, já que se trata de suspensão provocada por malefício sofrido pelo trabalhador em decorrência do ambiente e processo laborativos, portanto em decorrência de fatores situados fundamentalmente sob ônus e risco empresariais. Em tal quadro, a garantia de emprego de um ano que protege trabalhadores acidentados ou com doença profissional, após seu retorno da respectiva licença acidentária (art. 118, Lei nº 8.213/91), incide em favor do empregado, ainda que admitido por pacto empregatício a termo, em qualquer de suas modalidades, inclusive contrato de experiência. Afinal, a Constituição determina o cumprimento de regras jurídicas que restrinjam os riscos do ambiente laborativo, fazendo prevalecer o art. 118 da Lei Previdenciária em detrimento da limitação tradicionalmente feita pelo art. 472, § 2º, da CLT. Recurso de revista conhecido e provido.” (Processo: RR – 119400-38.2007.5.04.0030, Relator Ministro: Mauricio Godinho Delgado, 6ª Turma, Data de Publicação: DEJT 01/10/2010 – grifos apostos).
No caso, da leitura do acórdão regional constata-se que a empresa fornecedora de mão de obra submeteu o trabalhador à prestação de serviço temporário em período previamente definido, o que enseja outra modalidade de contrato.
No caso do trabalho temporário, quando corretamente aplicado e conforme dito anteriormente, não se trata de contrato de prazo fixo, razão pela qual, a hipótese jurídica não se ajustaria às condições de validade de contrato de trabalho, na forma do art. 443 da CLT, porque estaria ausente o vínculo de emprego e o prazo definido.
Portanto, quando se trata de prazo previamente ajustado fica, no nosso entender, desqualificado o trabalho como temporário e a Lei nº 6.019/74 não tem acolhida, valendo o item III da Súmula 378, do TST.
Paulo Sérgio João é advogado e professor de Direito Trabalhista da PUC-SP e FGV – http://www.psjadvogados.com.br/
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